Ao menos 73% dos custos com demência estão com famílias, revela estudo
Relatório mostra ainda que cuidadores estão sobrecarregados

Pelo menos 73% dos custos que envolvem o cuidado de pessoas com demência
no Brasil ficam para as famílias dos pacientes. O número foi divulgado pelo
Relatório Nacional sobre a Demência no Brasil (Renade), do Hospital Alemão
Oswaldo Cruz, a partir da iniciativa do Programa de Apoio ao Desenvolvimento
Institucional do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS). O estudo revelou que,
além dos custos, as pessoas responsáveis pelos cuidados estão sobrecarregadas e
que, na maior parte das vezes, são mulheres.
O relatório mostra que esses custos podem chegar a 81,3% por parte do
familiar a depender do estágio da demência.
“Isso envolve horas de dedicação para o cuidado. A pessoa, por exemplo,
pode ter que parar de trabalhar para cuidar. Isso tudo envolve o que a gente
chama de custo informal. É importante que se ofereça um apoio para a família”,
afirmou a psiquiatra e epidemiologista Cleusa Ferri, pesquisadora e
coordenadora do Projeto Renade no Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em entrevista à
Agência Brasil.
O relatório enumera custos diretos em saúde, como internações, consultas
e medicamentos, e também os recursos indiretos, como a perda de produtividade
da pessoa que é cuidadora.
“As atividades relacionadas ao cuidado e supervisão da pessoa com
demência consomem uma média diária de 10 horas e 12 minutos”, aponta o
relatório.
Olhar para o cuidador
A médica Cleusa Ferri avalia que é necessário aumentar o número de
serviços de qualidade que atendam às necessidades da pessoa com demência e
também dos parentes. “O familiar pode até ser um parceiro do cuidado. Mas
precisamos também pensar nesse cuidador”.
Brasília (DF) 24/12/2023 – A psiquiatra e epidemiologista Cleusa Ferri,
pesquisadora e coordenadora do Projeto Renade no Hospital Alemão Oswaldo Cruz,
em entrevista à Agência Brasil.
Foto: Cleusa Ferri/Arquivo Pessoal
Brasília (DF) 24/12/2023 – A psiquiatra e epidemiologista Cleusa Ferri,
pesquisadora e coordenadora do Projeto Renade no Hospital Alemão Oswaldo Cruz,
em entrevista à Agência Brasil. Foto: Cleusa Ferri/Arquivo Pessoal
Para elaboração do estudo, os pesquisadores entrevistaram 140 pessoas
com demência e cuidadores de todas as regiões do país, com média de idade de
81,3 anos sendo 69,3% mulheres. Os dados foram coletados com pessoas em
diferentes fases da demência.
O relatório mostra, por exemplo, que entre os 140 cuidadores, pelo menos
45% das pessoas apresentavam sintomas psiquiátricos de ansiedade e depressão,
71,4% apresentavam sinais de sobrecarga relativa ao cuidado, 83,6% exerciam o
cuidado de maneira informal e sem remuneração.
O estudo chama a atenção para que, dentro dessa amostra, 51,4% dos
pacientes utilizaram, em algum momento, o serviço privado de saúde, 42% não
utilizavam nenhum tipo de medicamento para demência. “Somente 15% retiravam a
medicação gratuitamente no SUS”, disse a epidemiologista Cleusa Ferri.
O estudo aponta que a maioria das pessoas cuidadoras de familiares com
algum tipo de demência são mulheres.
“Nessa amostra, temos 86% das cuidadoras sendo mulheres. Isso é um fato.
Há uma cultura da mulher cuidar para o resto da vida. Entendo que é uma questão
cultural.
Subdiagnósticos
De acordo com a pesquisadora, o Brasil contabiliza cerca de 2 milhões de
pessoas com demência e 80% delas não estão diagnosticadas. “A taxa de
subdiagnóstico é grande. Temos muitas pessoas sem diagnóstico e, portanto, sem
cuidado específico para as necessidades que envolvem a doença. Então, esse é um
desafio muito importante”, afirma a especialista. Ela cita que esse cenário não
é exclusivo do Brasil.
Na Europa, o subdiagnóstico chega a ser de mais de 50% e na América do
Norte, mais de 60%.
“No Brasil, temos 1,85 milhão de pessoas com a doença. E a projeção é
que esse número triplique até 2050”.
A pesquisadora acrescenta que a invisibilidade da doença é outro
desafio. “Temos muito para aumentar o conhecimento, deixar mais visível. A
falta de conhecimento da população sobre essa condição precisa ser enfrentada”.
Nesse contexto, a invisibilidade também ocorre diante das desigualdades
sociais.
Em um cenário de 80% de pessoas sem diagnóstico, isso significa a
necessidade de melhorar as políticas públicas para aumentar o conhecimento da
população sobre a demência. “Há uma questão de estigma também. As pessoas
evitam falar do tema e procurar ajuda”.
Essa situação, na avaliação da pesquisadora, também contribui para
dificuldades para conscientização, treinamento de cuidadores e busca por apoio.
Edição: Sabrina Craide/Fonte: Agência Brasil